Stephanie de Jesus da Silva (26) e Christian Campoçano Leitheim (27), vão à júri popular nos próximos dois dias, ambos são réus pela morte de Sophia de Jesus Ocampo, morta em 26 de janeiro de 2023. Iniciado na manhã desta quarta-feira (4), o julgamento conta com plenário do júri lotado, protesto, e estudantes de direito da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS) e Universidade Católica Dom Bosco (UCDB).
De acordo com o cronograma previsto, serão ouvidas testemunhas durante a manhã, entre elas – duas testemunhas de acusação, arroladas pelo Ministério Público de Mato Grosso do Sul (MPMS); cinco testemunhas de defesa de Stephanie, investigador de polícia, médica e médico legista.
Às 13h começam as oitivas de cinco testemunhas de defesa de Christian Campoçano Leitheim. Os réus serão ouvidos depois, mesmo que o julgamento avance noite adentro.
No segundo dia de julgamento serão realizados os debates de acusação e defesa, seguidos pela votação dos quesitos e sentença final do caso. O julgamento teve início às 8h36, ao passo que os réus adentraram ao plenário por volta das 8h40.
Pai de Sophia, Jean Carlos Ocampo chegou ao júri ao lado de seu marido, Igor de Andrade. O pai da criança disse que quer justiça e que a ida até o tribunal é uma forma também de enfrentar “seus leões”, em referência a Stephanie e Christian.
“Estou aqui pela Sophia, coloquei minha dor de lado, coloquei minhas ansiedades de lado, e vim à Justiça lutar por ela. Que a Justiça seja feita, que eles olhem pela Sophia, esse é meu desejo, do Igor e de todos aqueles que amam a Sophia”, falou em sua chegada.
Questionado sobre o julgamento e todos os trâmites desde a morte de sua filha, Jean Ocampo disse que enfrentar ambos os acusados era algo necessário para seguir adiante.
“Eles dois eram meus leões. Precisei vir, ver eles de frente para poder conseguir prosseguir, e hoje da mesma forma que nem aquele dia, eu olhando os dois vou conseguir, vou continuar.”, complementou.
Sophia morreu em 26 de janeiro de 2023 por um traumatismo na coluna causado por agressão física. Além das diversas lesões no corpo, a criança apresentava, ainda, sinais de estupro.
Últimas horas de Sophia
Em fevereiro de 2024, o Ministério Público de Mato Grosso do Sul fez um relatório sobre as últimas horas de vida da criança, baseado em mensagens encontradas no celular do padrasto, Christian Campoçano.
O documento foi apresentado pela promotora Ana Lara Camargo de Castro, e incluído nos autos do processo judicial.
25 de janeiro – 14h30
Christian envia mensagem para Stephanie dizendo que estava irritado porque a internet da residência estava lenta e por isso não conseguia se conectar aos jogos onlines.
Neste momento, o réu relatou que Sophia estaria chorando,dizendo à mulher que a menina estaria “endemoniada”, e que por isso havia mandado a criança se deitar. Ainda conforme relatado nas mensagens, Sophia não obedeceu, e por isso ele teria a agredido. Segundo a promotora, foi nesse momento que a vítima sofreu as agressões que a levaram a óbito.
Ana Lara Camargo afirma que “tal conclusão se dá” porque algumas horas depois de relatar que estaria irritado, o réu enviou mensagens por volta das 18h, relatando que Sophia apresentava febre e quadro de vômito.
25 de janeiro – 18h
Após a mensagem relatando que Sophia estaria com febre e vomitando, Christian contou que ministrou soro e dois tipos de medicamentos, além de ter dado um pano para a criança não se sujasse, já que ela havia vomitado diversas vezes.
“Sophia foi agredida com tapas e “quebra-costela”, como forma de punir a vítima, agressões que eram seguidas de sufocamento como forma de interromper o choro da criança, cujo pranto era silenciado pela ânsia de respirar enquanto tinha seu rosto pressionado contra um colchão”, diz o relatório.
O documento relata as falas de Christian ao ver Sophia passando mal.
“Dá uns tapão nela, aí você vira a cara dela pro colchão e fica segurando porque aí ela para de chorar. É sério. Parece até tortura mais [sic] não é, porque aí ela fica sem ar para chorar e para de chorar. Entendeu?”, orienta o réu acusado, conforme relata o relatório.
26 de janeiro – 0h
Stephanie e um amigo, saem em busca de remédios. Ela retorna algumas horas depois, e Christian vai dormir por volta das 5h.
26 de janeiro – 16h:
O acusado relatou que teve conhecimento geral sobre o estado de Sophia somente nesse horário, quando foi acordado por Stephanie dizendo que a filha estava com a boca roxa e convulsionando.
26 de janeiro – 18h
Christian, após o conhecimento de que a vítima estaria passando mal, liga para a própria mãe dizendo que Sophia estava convulsionada e não conseguia respirar e que a menina seria levada para o Pronto Socorro.
Chegada à Unidade de Pronto Atendimento
Quando chegou à Unidade de Pronto Atendimento (UPA) Coronel Antonino, em Campo Grande, Sophia já estava morta a pelo menos 7 horas.
As enfermeiras que realizaram os primeiros atendimentos constataram que a menina já apresentava rigidez cadavérica quando chegou à unidade. Posteriormente, a perícia constatou que o corpo estava sem vida a 7 horas.
O laudo necroscópico do Instituto de Medicina e Odontologia Legal (Imol) indicou que Sophia morreu por um traumatismo na coluna causado por agressão física. Além das diversas lesões no corpo, a criança apresentava, ainda, sinais de estupro.
Mensagens trocadas entre a mãe de Sophia e o padrasto, no momento em que a mulher estava na UPA, indicam que a dupla já sabia que a menina estava morta.
“Eu não tenho condições de cuidar de filhos. […] Eu te avisei que sua vida ia ficar pior comigo, mas você não acreditou”, disse Christian Leitheim à mãe de Sophia.
Na mesma conversa, o homem ainda ameaça tirar a própria vida após Stephanie o informar que Sophia está morta.
“Tô saindo. Não vou levar o celular e nem identidade para, quando me acharem, demorar para reconhecer ainda. Desculpa, Stephanie, vou sair da sua vida”, disse o padrasto em uma das mensagens.
Ainda de acordo com o documento a que o Correio do Estado teve acesso, logo após dar a notícia da morte da criança, Stephanie conta que exames constataram que Sophia tinha sido estuprada. Esse fato foi relatado pela mãe à polícia quando prestou os primeiros esclarecimentos e confirmado por meio de laudo necroscópico.
“Disseram que ela foi estuprada”, disse Stephanie, ao que Christian respondeu: “Nunca. Isso é porque não sabem o que aconteceu com ela e querem culpar alguém. Sei que você não vai acreditar em mim”.
O padrasto completou: “Se você achar que é verdade, pode me mandar preso, pode fazer o que quiser”.
Durante o diálogo, ele ainda dá a entender que não teria sido a primeira vez que Sophia havia sofrido algum tipo de agressão grave, já que ele disse para a mãe “inventar qualquer coisa” que justificasse os hematomas.
“Fala que se machucou no escorregador do parquinho, igual da outra vez”, sugeriu.
Em dois anos e sete meses de vida, Sophia já havia passado por pelo menos 30 atendimentos nas unidades de saúde.
Fonte: Correio do Estado