O Estado sempre foi conhecido como tradicional rota para a cocaína e a maconha entrarem no Brasil. Isso por conta da fronteira com o Paraguai e a Bolívia.
Uma mudança nessa característica está sendo notada nos últimos 12 meses, com a identificação de que Mato Grosso do Sul também é o caminho para que produtos químicos sejam levados para a Bolívia, onde ocorre a produção de cocaína, e depois o entorpecente volte para o País.
Entre setembro de 2021 e março deste ano, a Polícia Federal interceptou dois grandes carregamentos do acetato de etila, utilizado para refino da cocaína.
A Perícia Oficial da PF identificou que 87% dessa droga aprendida no Brasil é feita a partir desse solvente.
Essa substância química é trazida de São Paulo para Corumbá em caminhões, mantém-se escondida em galpões dentro da cidade e depois segue para a Bolívia, onde acaba sendo “exportada” por rotas alternativas, burlando a fiscalização da aduana.
Essa situação passou a ficar mais gritante com a última apreensão que a Polícia Federal fez em território corumbaense.
Dentro de um galpão de transportadora no município, investigadores localizaram 231 toneladas de acetato de etila em cinco caminhões da cidade de São Paulo.
A carga estava sem documentação. A Delegacia da PF em Corumbá obteve informações para chegar ao carregamento, na sexta-feira (18).
A quantidade de acetato de etila descoberta neste mês poderia render uma produção de cerca de 17,7 mil kg de cocaína de alto grau de pureza, que no mercado ilegal tem valor mais alto.
Essa produção, por exemplo, geraria para traficantes em torno de R$ 444 milhões, conforme estimativas apuradas com autoridades policiais.
Esses números indicam que a “indústria da cocaína” está com mercado aquecido para realizar a importação de produtos a partir do Brasil e, depois, devolver a droga para o País de forma fracionada, tanto sendo trazida por meio rodoviário ou aéreo.
Rotas por rio também são utilizadas, mas com menor frequência.
O monitoramento desse fluxo ligado ao tráfico transnacional de drogas está sendo acompanhado pela Polícia Federal desde 2021, quando as primeiras apreensões de substâncias químicas começaram a ser realizadas.
No ano passado, foram quatro apreensões, a maior delas em setembro, quando 130 mil quilos foram encontrados perto do porto seco de Corumbá, em cinco caminhões.
O inquérito policial sobre a origem desse produto e o destino final, na Bolívia, ainda está aberto e por isso a PF não se manifestou para dar detalhes.
Porém, a ousadia dos traficantes em manter a rota aberta para exportar acetato de etila e, depois, importar a cocaína segue elevada.
Mesmo com as apreensões de 2021, os carregamentos continuam sendo realizados na mesma rota, usando a BR-262, em Mato Grosso do Sul, para se chegar a vicinais que dão acesso ao país vizinho.
Por enquanto, nenhuma prisão envolvendo mandantes dessas cargas ocorreu. Essa etapa de identificação está sendo uma das mais complicadas para as autoridades.
“Não houve prisões, porém todos os autuados infringiram o disposto na Lei nº 10.357/2001 e poderão responder tanto administrativamente quanto criminalmente, de acordo com suas responsabilidades”, declarou a Polícia Federal em nota divulgada sobre a apreensão das 231 toneladas de acetato, realizada no dia 18.
Lei
A Lei nº 10.357 trata sobre controle e fiscalização sobre produtos químicos que direta ou indiretamente possam ser destinados à produção de entorpecentes.
A multa administrativa, no caso de infração dessa legislação, pode variar de R$ 2,128 mil a R$ 1,064 milhão, bem abaixo do potencial que a química tem para gerar valor com o entorpecente.
Toda importação ou exportação desse tipo de produto precisa, obrigatoriamente, receber autorização da PF.
“O que a gente tem percebido aqui na região de fronteira é que houve uma mudança de estratégia e rotas por parte do crime organizado, por conta da instalação dos radares na fronteira com o Paraguai, em Porto Murtinho e Ponta Porã, e com a Bolívia em Corumbá”, analisou o coronel Wagner Ferreira da Silva, diretor do Departamento de Operações de Fronteira (DOF).
“Essa entrada acontece mais pela região do Paraguai e, com isso, houve um aumento nas apreensões de cocaína, principalmente aqui na região sul de Mato Grosso do Sul”, completou.