A varejista Americanas disse nesta quarta-feira que seu presidente-executivo e seu diretor financeiro renunciaram após a descoberta preliminar de cerca de 20 bilhões de reais em “inconsistências” contábeis no balanço da companhia. Sergio Rial sai 10 dias após assumir o cargo, depois de seis anos à frente do Santander Brasil. Rial substituiu Miguel Gutierrez, que foi presidente da Americanas por cerca de 20 anos. O diretor financeiro Andre Covre também havia acabado de ingressar na Americanas.
A varejista afirmou que a decisão de Rial de sair refletiu a “alteração de prioridades da administração” e que ele continuará como assessor dos acionistas de referência, os bilionários Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira, fundadores da 3G Capital.
O grupo afirmou que apesar de não conseguir determinar todos os impactos no balanço da empresa neste momento, acredita “o efeito caixa dessas inconsistências seja imaterial”.
Como referência, o atual valor de mercado da Americanas, um dos maiores grupos varejistas da América Latina, é de cerca de 11 bilhões de reais. O patrimônio líquido da companhia no fim de setembro era de 14,7 bilhões de reais.
Em carta aos funcionários vista pela Reuters, Rial disse que a posição de caixa da Americanas é de 8 bilhões de reais e que a empresa “continuará pagando fornecedores e outras obrigações em dia”. Rial também disse que a empresa precisará abordar sua posição de patrimônio líquido, o que pode exigir um aumento de capital, mas essa não seria a única opção. O agora ex-presidente da Americanas discutirá as conclusões sobre a contabilidade da companhia em uma conferência com investidores organizada pelo BTG Pactual na manhã de quinta-feira, confirmou o banco.
Para profissionais do mercado, o anúncio deve acertar em cheio as ações da companhia.
“Como uma empresa do tamanho da Americanas, cujos relatórios financeiros passam por auditoria, consegue esconder 20 bilhões de reais de dividas”, questionou Fabrício Gonçalves, presidente da Box Asset Management. “Para nós, isso vai gerar um fluxo vendedor muito grande.”
Segundo a Americanas, as inconsistências foram detectadas em redutores da conta de fornecedores em anos anteriores, incluindo 2022, e a cifra de 20 bilhões de reais refere-se à data-base de 30 de setembro passado.
O conselho de administração da empresa determinou a criação de um grupo para apurar as circunstâncias que geraram os problemas na contabilidade.
OTIMISMO ABREVIADO
A ação da Americanas, formada em 2021 com a união das lojas físicas do grupo com a operação online que estava sob a antiga B2W, teve em 2022 queda de 68,7%, em linha com a desvalorização das ações de empresas de tecnologia, diante de desaceleração das vendas, inflação e juros altos. No terceiro trimestre, a Americanas teve prejuízo de mais de 200 milhões de reais.
Em agosto, as ações da Americanas chegaram a disparar quase 20% em um só dia, após o anúncio de que, em substituição a Miguel Gutierrez, que ocupava o cargo por 20 anos, Rial assumiria o comando da empresa, o que aconteceu semana passada.
A revelação das falhas contábeis ocorre após um ano difícil para a Americanas, que começou com a companhia perdendo cerca de 1 bilhão de reais em vendas após um ataque hacker em fevereiro passado
A Americanas deve divulgar seus resultados de 2022 em 29 de março. Analistas, por ora, esperam um lucro operacional medido pelo Ebitda de 2,9 bilhões de reais e receita líquida de 28,7 bilhões para o acumulado do ano passado, segundo dados da Refinitiv.
(Reportagem Paula Arend Laier, Carolina Pulice, Tatiana Bautzer e Aluísio Alves, edição Alberto Alerigi Jr.)