O coração de D. Pedro I, que Portugal decidiu emprestar ao Brasil para a comemoração dos 200 anos da Independência, vai sair da cidade portuguesa do Porto na noite de domingo (21). A relíquia chega a Brasília na segunda-feira (22), em um traslado que desagradou muitos cientistas.
A viagem vai ser feita pela Força Aérea Brasileira. A primeira parada é no Palácio do Planalto.
“O coração do nosso D. Pedro será recebido com honras de chefe de Estado, com salvas de canhão e escoltado pelos Dragões da Independência, ficará fora cerca de 20 dias, mas vai regressar com mais reconhecimento e admiração por parte do povo brasileiro”, afirmou o presidente da prefeitura local, Rui Moreira.
Em seguida, o órgão vai para o Palácio do Itamaraty e fica em exibição até as comemorações do bicentenário. A viagem de volta para a cidade do Porto está marcada para o dia seguinte, 8 de setembro.
As negociações para o empréstimo do coração levaram cerca de quatro meses e envolveram o governo português, a Câmara do Porto e representantes da Irmandade da Lapa, entidade religiosa que guarda a relíquia.
Reações contrárias
Desde que o pedido do empréstimo do coração foi divulgado, vários intelectuais, nos dois países, se manifestam contra o translado. Para a arqueóloga e historiadora brasileira Valdirene Ambiel, a viagem é um desrespeito à memória de D. Pedro I e pode ser instrumentalizada como propaganda política.
“Em 1972 foi quando o corpo de D. Pedro foi trasladado para o Brasil, lamentavelmente foi usado de maneira política, durante o regime militar”, diz a historiadora à RFI. “O bicentenário é um evento muito importante, mas, acima de tudo, nós brasileiros temos que nos preocupar com a reflexão sobre a nossa independência. Não que a figura de D. Pedro tenha que ser esquecida, jamais, nem a importância dele para esse país”, completa.
Para as comemorações dos 150 anos da independência, o então presidente militar, general Emílio Garrastazu Médici, coordenou o traslado do corpo de D. Pedro I de Portugal para o mausoléu do Monumento à Independência, em São Paulo, à margem do simbólico rio Ipiranga.
“O que eu observei 40 anos depois, em 2012, é que não houve respeito pelo ser humano, pelo estado em que encontrei o corpo de D. Pedro”, diz Valdirene Ambiel.
A historiadora desenvolve um estudo baseado em análises dos restos mortais do imperador e das imperatrizes Leopoldina e Amélia, que também estão no mausoléu. “A condição dessa edificação é péssima. A última vez em que estive no espaço foi pouco antes da pandemia e a umidade no local era deplorável”.
Para a historiadora, além de um “desrespeito à dignidade” de D. Pedro I, o pedido do coração é um gasto de dinheiro público desnecessário.
Exposição inédita
Mesmo com as controvérsias, a viagem do coração também vai garantir uma oportunidade inédita para que a população da cidade do Porto veja o coração de perto.
Para isso, foi construída uma vitrine especial, com proteção para o caso de quedas. A montagem da instalação levou em conta a altura média de brasileiros e portugueses, e o coração vai ficar posicionado como se estivesse no lugar correto dentro de um corpo humano.
Vai haver ainda um esquema de segurança para evitar aglomerações próximas da vitrine e presença permanente de policiais. Quando o coração chegar de volta ao Porto, no dia 9 de setembro, vai haver mais um final de semana de exposição e uma cerimônia de encerramento para guardar novamente a relíquia no cofre.