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Planeta 3 graus mais quente agravará ondas de calor em cidades brasileiras

Por Redação

Em 19 de setembro de 2024

Imerso na mais grave seca da história após meses de temperatura acima da média, o Brasil pode viver crises desta magnitude com maior frequência nas próximas décadas. Se o planeta continuar na rota atual de 3 °C de aquecimento em relação à era pré-industrial, as ondas de calor, transmissão de doenças e demanda por energia para ar-condicionado terão impactos devastadores.

A conclusão é de um estudo feito pelo World Resource Institute (WRI) divulgado nesta quinta-feira (19/09). A análise considerou dados de 996 cidades com população superior a 500 mil habitantes. Do Brasil, 32 entraram na lista. Entre elas estão Manaus, Belém, Aracaju, Goiânia, Cuiabá, Uberlândia, Belo Horizonte, São Paulo, Santos, Rio de Janeiro, Curitiba, Porto Alegre, Maceió e Fortaleza.

Os pesquisadores compararam indicadores de risco de áreas estratégicas como saúde pública, infraestrutura e produtividade econômica para entender como as cidades respondem a diferentes cenários: sob 1,5 °C, 2 °C e 3 °C de aquecimento da temperatura média da Terra.

“A diferença entre 1,5 °C e 3 °C tem consequências de vida ou morte para bilhões de pessoas no mundo todo”, afirma Rogier van den Berg, diretor global do WRI Ross Center for Sustainable Cities, que liderou o estudo.

Os piores impactos serão sentidos pelos mais pobres: considerando todo o globo, moradores de cidades de menor renda localizadas na África Subsaariana, América Latina e Sudeste Asiático serão os mais afetados.

O aumento da temperatura da Terra já uma realidade. As atuais medições indicam que 2024 pode bater o ano anterior e superar o recorde como o mais quente da história. Até agora, o planeta está 1,4 °C mais quente em relação à época anterior à Revolução Industrial, quando a sociedade passou a ser movida a partir da queima de combustível fóssil.

Ondas de calor

Caso a temperatura média suba 3 °C, a previsão é que a frequência de ondas de calor aumente de 4,9 para 6,4 vezes por ano em média. Elas também serão mais longas: passarão de 16,3 para 24,5 dias em média.

Segundo os pesquisadores do WRI, moradores de 16% das cidades avaliadas enfrentarão pelo menos uma vez ao ano uma temporada extrema com duração de um mês. Na América Latina, a frequência de ondas de calor pode dobrar e chegar a 7,5 ocorrências por ano.

O quadro deve se agravar em praticamente todas as 32 cidades brasileiras analisadas. Cuiabá, por exemplo, pode enfrentar até 12 ondas de calor por ano – algumas podem durar 32 dias, sugere um dos modelos usados nos cálculos do WRI. Até na região Sul esse número vai aumentar: sete ondas de calor podem atingir Curitiba anualmente, mostra o levantamento.

Será mais difícil para o corpo humano se aclimatar nestas condições. O aumento excepcional da temperatura de forma repentina pode sobrecarregar o sistema cardiovascular, respiratório e urinário e agravar doenças relacionadas ao calor.

Uma pesquisa de 2021 realizada pela Fundação Oswaldo Cruz mostrou que as altas temperaturas podem elevar o índice de mortalidade na população acima de 60 anos que sofre de doenças respiratórias ou cardiovasculares.

Mais doenças

A subida do termômetro favorece a propagação em especial de um tipo de organismo: mosquitos transmissores de doenças. Eles podem carregar arbovírus que transmitem dengue, febre amarela, zika e chikungunya, entre outros.

O estudo do WRI estima que, caso a temperatura do planeta suba 3 °C, novos lugares no mundo “ganhariam” um ambiente propício para a multiplicação desses vetores. Em grandes metrópoles, onde eles já são presentes, o pico de transmissão pode se alongar em média por mais seis dias.

No Brasil, que enfrentou em 2024 sua mais grave epidemia de dengue, o risco vai se agravar. No Rio de Janeiro, 3 °C extras podem elevar de 69 para 118 os dias propícios para infecção, um aumento de 71%. Segundo o Ministério da Saúde, cerca de 6 milhões de brasileiros pegaram dengue neste ano até agora. Foram quase 4 mil mortes confirmadas pela doença, e a maioria das vítimas tinham entre 20 e 29 anos.

Para a malária, o aumento nas temperaturas globais de 1,5°C para 3°C tem um efeito reverso: o número de dias ideias para transmissão da doença pode cair de 114 para 104,4 dias em média em todo mundo. Mas o impacto do aquecimento em regiões mais frias, como Europa e América do Norte, favorece o aparecimento da doença onde ela atualmente não é presente.

Energia para refrescar

Para lidar com o calor extremo, moradores de cidades que tiverem condições financeiras devem investir em aparelhos de ar-condicionado – o que aumenta a demanda por energia. As estimativas do WRI mostram que, com 3 °C a mais, pelo menos 194 milhões de pessoas vão aumentar em 100% seu consumo de eletricidade destinada para resfriamento.

Na América Latina, o clima mais quente fará com que a demanda por energia para abastecer os aparelhos de ar-condicionado sofra a maior alta em relação às demais, mostram os cálculos.

Até em países com clima mais ameno e não acostumados ao uso de ar-condicionado, como os europeus, a demanda vai crescer. Em 2023, o ano mais quente já registrado até então, as vendas de aparelhos subiram em média 16% nas semanas de verão do Hemisfério Norte, estimou a Agência Internacional de Energia (IEA, na sigla em inglês).

Atualmente, o resfriamento representa cerca de 10% da demanda de eletricidade global, afirma a IEA. Além de aumentar a pressão sobre os sistemas de energia, o calor extremo e o consumo de ar-condicionado geram picos na demanda por eletricidade – o que pode levar a um ciclo vicioso de aumento nas emissões de gases de efeito estufa para a geração dessa carga extra.

No Brasil, o calor, a seca atual e o nível baixo nos reservatórios das hidrelétricas contribuem para que a conta de energia fique mais cara. A partir de setembro, o brasileiro vai pagar R$ 4,46 a mais para cada 100 quilowatts-hora (kWh) consumidos, de acordo com a bandeira vermelha do sistema tarifário controlado pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).

Investir em adaptação

Frente ao prognóstico, uma das soluções para as cidades é investir em infraestrutura verde, avalia Keila Ferreira, coordenadora de baixo carbono e resiliência do Iclei no Brasil, uma associação mundial de governos locais e subnacionais dedicados ao desenvolvimento sustentável.

“Criação de espaços arborizados para reduzir o calor urbano e uso de materiais permeáveis para controlar enchentes são exemplos práticos”, cita Ferreira. “Uma cidade que investe em energia solar ou eólica, por exemplo, reduz a dependência de fontes fósseis e emissão de gases de efeito estufa colaborando para estabilização do clima”, complementa.

Fonte: IstoÉ

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