A área desmatada na Amazônia foi de 11.568 km² entre agosto de 2021 e julho de 2022 (o equivalente ao tamanho do Catar), de acordo com números oficiais do governo federal divulgados nesta quarta-feira (30) pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).
Quando comparado o último levantamento do Inpe, houve uma queda de 11% do total da área desmatada entre as duas temporadas. Na edição anterior, o número foi de 13.038 km² entre agosto de 2020 e julho de 2021.
Os números são do relatório anual do Projeto de Monitoramento do Desmatamento na Amazônia Legal por Satélite (Prodes), considerado o mais preciso para medir as taxas anuais. Ele é diferente do Sistema de Detecção de Desmatamento em Tempo Real (Deter), que mostra os alertas mensais – e que já sinalizava recordes no aumento da devastação nos últimos meses.
De acordo com o Observatório do Clima, que é uma rede de entidades ambientais, apesar de queda neste último levantamento, o desmatamento na Amazônia cresceu 59,5% durante os quatro anos de governo do presidente Jair Bolsonaro (PL): é a maior alta percentual num mandato presidencial desde o início das medições por satélite, em 1988.
“Bolsonaro pegou o país com uma taxa de 7.500 km² de desmatamento na Amazônia e o está entregando com 11.500 km²”, afirma Marcio Astrini, secretário-executivo do Observatório do Clima.
Ainda segundo a entidade, o relatório do Prodes feito pelo Inpe, órgão ligado ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI), estava pronto desde o dia 3 de novembro e só foi divulgado agora, três semanas depois. Para o Observatório do Clima, a demora se deu por conta da COP 27, a Conferência do Clima da ONU, que foi realizada no Egito em novembro.
Nos últimos 20 anos, o índice atingiu sua marca mais alta em 2004, quando 27,7 mil km² foram desmatados.
Porém, depois disso, quando levado em consideração o período seguinte, houve uma queda constante nessas taxas e a temporada com menor desmatamento na Amazônia em toda a série histórica do Prodes foi 2012, com 4,5 mil km².
Mas a situação se inverteu novamente em 2015 e a área desmatada aumentou, chegando a 10.129 km² em 2019, 10.851 km² em 2020 e 13 mil km² em 2021.
Enfraquecimento da política ambiental
Na avaliação do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), o avanço do desmate nesses últimos anos, principalmente sob o governo Bolsonaro, tem ligação direta com o enfraquecimento dos órgãos de fiscalização e, portanto, pela falta de punição a crimes ambientais.
Na visão do instituto, isso é acompanhado pela redução significativa de ações imediatas de combate e controle de atividades ilegais na região.
“No caso da Amazônia, essa aparente governança que se estabeleceu principalmente durante os mandatos do governo Lula foi completamente perdida e enfraquecida durante o governo Bolsonaro”, explica ao g1 Ane Alencar, diretora de Ciência do Ipam.
“Todas as instituições que cuidavam do meio ambiente foram marginalizadas de uma certa forma, drenadas e enfraquecidas do seu comando até a quantidade de recurso que recebiam”.
Somente no caso do Ibama, responsável por fiscalizar o desmatamento, um levantamento do Observatório do Clima mostrou que menos da metade do orçamento previsto do Instituto foi utilizado para prevenção e controle de incêndios florestais em 2022.
E no começo da gestão Bolsonaro, em 2019, a situação não foi muito diferente. Na época, o então ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, pediu um corte de 24% do orçamento anual previsto para o órgão. Já em 2021, ambientalistas denunciaram que a então proposta de orçamento do Ministério do Meio Ambiente era a menor em 21 anos.
Essa baixa execução coincide também com a baixa taxa de multas aplicadas por crimes ambientais em áreas de conservação do Instituto Chico Mendes de Biodiversidade (ICMBio), que é vinculado ao Ibama e responsável por fiscalizar unidades de conservação florestal em todo o país.
Como mostrou o Jornal Nacional, nos últimos cinco anos, de cada R$ 100 em multas aplicadas por crimes ambientais em áreas de conservação do órgão, apenas R$ 1 foi pago.
“O Brasil passou por quase quatro anos bem complicados e dramáticos em relação a pauta ambiental”, avalia Marcelo Laterman, porta-voz de Clima e Justiça do Greenpeace Brasil.
E no começo da gestão Bolsonaro, em 2019, a situação não foi muito diferente. Na época, o então ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, pediu um corte de 24% do orçamento anual previsto para o órgão. Já em 2021, ambientalistas denunciaram que a então proposta de orçamento do Ministério do Meio Ambiente era a menor em 21 anos.
Entrave do Fundo Amazônia
Outra questão importante apontada por especialistas como fundamental para o controle do desmatamento nesses últimos anos é o Fundo Amazônia.
Criado em 2008 para financiar projetos de redução do desmatamento e fiscalização, o Fundo está parado desde abril de 2019, quando o governo Bolsonaro extinguiu os colegiados Comitê Orientador (COFA) e o Comitê Técnico (CTFA), que formavam a base do fundo.
No início deste mês, no entanto, o Supremo Tribunal Federal (STF) determinou a reativação do fundo em um prazo de 60 dias.
Um relatório de auditoria elaborado pela Controladoria Geral da União (CGU) apontou, em junho, que a gestão do Ministério do Meio Ambiente do governo Bolsonaro colocou em risco a continuidade do Fundo Amazônia e, por conseguinte, uma série de políticas ambientais, ao extinguir de forma unilateral, “sem planejamento e fundamentação técnica” colegiados que formavam a base dessa iniciativa de financiamento.
De acordo com a CGU, até dezembro do ano passado, o fundo já tinha cerca de R$ 3,2 bilhões parados para a destinação a novos projetos. Em 2020, o então ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, afirmou que o governo federal não recriou o Conselho Orientador do Fundo porque a Noruega e a Alemanha, principais doadores, rejeitaram mudanças no modelo de gestão dos recursos.
A Alemanha e a Noruega, que juntas foram responsáveis por mais de 99% dos depósitos ao Fundo, suspenderam os repasses em 2019.
Este mês, porém, após a definição das urnas do último domingo, consagrando a vitória de Luís Inácio Lula da Silva como o próximo presidente do país, os dois países já sinalizaram que irão retomar a ajuda financeira contra o desmatamento da Amazônia.
Queimadas
Os alertas de queimadas na Amazônia foram pelo mesmo caminho nesses quatro anos de governo. Em setembro deste ano, mesmo sem fechar o mês, superamos o total registrado em todo 2021. As queimadas são consequência do aumento do desmatamento na Amazônia.
Também no governo Bolsonaro e em 2022, a Amazônia teve o pior dia de queimadas em 15 anos, com 3,3 mil focos. Antes, dia mais recente no ‘ranking’ de queimadas foi 30 de setembro de 2007.