
Assim que chegou na Casa Branca nesta segunda-feira (18/8), o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, foi recebido por Donald Trump dizendo que “amava” os ucranianos.
Questionado por jornalistas sobre uma mensagem ao povo ucraniano, o presidente americano disse “eu amo eles”.
O encontro se iniciou com uma breve conversa entre Zelensky e Trump no salão Oval, em frente às câmeras, passando depois para algumas perguntas de jornalistas antes deles se sentarem com mais sete líderes europeus.
Parte da reunião foi transmitida ao vivo para todo o mundo. Por isso, foi possível concluir que o presidente russo, Vladimir Putin, já saiu com ao menos uma vitória.
Trump disse não acreditar que um cessar-fogo seja necessário para o fim da guerra, uma reversão de sua posição anterior às conversas com Putin na sexta-feira no Alasca.
“Estrategicamente, isso [um cessar-fogo] pode ser uma desvantagem para um dos lados”, disse Trump a jornalistas.
Isso é música para os ouvidos de Vladimir Putin. O líder russo insiste há muito tempo que somente um acordo de paz abrangente nos termos de Moscou deve vir primeiro, seguido de um cessar-fogo.
Trump também prometeu garantias de segurança para a Ucrânia, algo com que Putin havia concordado no encontro de sexta. Mas não ficou claro de que forma essa proteção seria garantida, se liderada pela Otan, ou se poderá contar com outro envolvimento americano.
“Acredito que as nações europeias vão assumir grande parte do fardo”, afirmou. “Vamos ajudá-las.”
O republicano também disse que planeja falar com Putin ainda nesta segunda.
Antes da reunião começar, ainda no salão Oval, Zelensky disse “obrigado” a Trump e ao governo americano seis vezes nos primeiros minutos em que falou.
Trump, por sua vez, agradeceu a Zelensky por estar nos EUA e disse que “progressos estão sendo feitos” para pôr fim à guerra entre a Rússia e a Ucrânia.
Ele disse que teve uma reunião “muito boa” com Putin e que há “uma boa possibilidade de que algo possa sair disso”.
O presidente ucraniano entregou então uma carta de sua esposa, Olena Zelenska, para a primeira-dama americana, Melania Trump, agradecendo a ela por seus esforços empenhados em trazer de volta para casa as crianças ucranianas mantidas na Rússia.
Zelensky foi questionado por jornalistas sobre quais garantias deseja dos EUA. O líder ucraniano disse que precisa de “tudo”, incluindo equipamentos e inteligência. No início da conversa, houve um momento descontraído em que Zelensky foi elogiado por um repórter por sua vestimenta — o mesmo jornalista que criticou o traje de Zelensky em fevereiro.
Crédito,Alexander Drago/Reuters
A expectativa é que a reunião desta segunda seja mais crucial para o futuro da Ucrânia — e para a segurança de toda a Europa — do que foi a cúpula entre Trump e o líder russo, Vladimir Putin, na sexta-feira passada, no Alasca.
Pouco antes do encontro, o presidente finlandês, Alexander Stubb, foi visto chegando à embaixada ucraniana em Washington, D.C. para uma “reunião preparatória” com Zelensky.
Enquanto Trump, Zelensky e os líderes europeus se preparavam para o encontro, Putin se ocupava ligando para seus homólogos em outros países.
O líder russo fez uma chamada para Lula, Cyril Ramaphosa, presidente da África do Sul, Narendra Modi, da Índia, e Emomali Rahmon, do Tajiquistão.
Segundo informações oficiais do Kremilin, Putin estava atualizando as outras lideranças sobre sua reunião no Alaska no fim de semana. Em nota, o Planalto afirmou que o líder russo avaliou o encontro como positivo.
“Após abordar os diversos temas discutidos com o presidente Trump, Putin reconheceu o envolvimento do Brasil com o Grupo de Amigos da Paz, iniciativa conjunta com a China”, disse o governo russo em nota.
A presença do premiê do Reino Unido, Keir Starmer, do presidente da França, Emmanuel Macron, do chanceler da Alemanha, Friedrich Merz, e de outros líderes ao lado de Zelensky vai além da tentativa de que ele não seja novamente emboscado no Salão Oval, como aconteceu em 28 de fevereiro.
Os líderes europeus estão determinados a incutir em Trump duas coisas.
Crédito,Kevin Lamarque/Reuters
Primeiro, que não pode haver acordo de paz para a Ucrânia sem o envolvimento direto da Ucrânia. E, segundo, que o acordo deve ser apoiado por garantias de segurança “rígidas”.
Acima de tudo, os líderes europeus querem que o presidente dos EUA veja a Ucrânia e a Europa como uma frente unida. E querem garantir que Trump não seja influenciado por sua óbvia afinidade pessoal com Vladimir Putin a ceder às exigências dos russos.
Nesse ponto, as habilidades diplomáticas do premiê britânico, Keir Starmer, serão testadas.
Trump gosta de Starmer e o ouve. E dentro de um mês Trump fará uma visita de Estado ao Reino Unido.
Ele também gosta de Mark Rutte, o secretário-geral da aliança militar Otan, que estará presente — e que às vezes é chamado de “Encantador de Trump”.
O presidente americano parece ter menos apreço pelo presidente Macron. A Casa Branca criticou duramente sua intenção recente de reconhecer incondicionalmente um Estado palestino na próxima Assembleia Geral da ONU.
Para que um acordo de paz na Ucrânia tenha alguma chance de funcionar, alguém precisará ceder.
Líderes europeus têm dito frequentemente que as fronteiras internacionais não podem ser alteradas por força. Já Zelensky tem afirmado repetidamente que não abrirá mão de território e que a Constituição da Ucrânia proíbe isso.
Mas Putin quer a região do Donbas, onde suas forças já controlam cerca de 85% do território, e ele não tem absolutamente nenhuma intenção de devolver a Crimeia.
No entanto, como me disse certa vez a ex-primeira-ministra da Estônia e agora vice-presidente da Comissão Europeia e mais alta diplomata do bloco, Kaja Kallas, uma vitória da Ucrânia nesta guerra não precisa ser pautada exclusivamente pela reconquista de territórios ocupados.
Crédito,José Luis González/Reuters
Se a Ucrânia conseguir obter o tipo de garantia de segurança prevista pelo artigo 5 da Otan, suficiente para dissuadir qualquer futura agressão russa e salvaguardar sua independência como um Estado livre e soberano, isso já seria uma forma de vitória.
O Artigo 5 da Otan prevê que um ataque a um país-membro é considerado um ataque a todos.
Os EUA e a Rússia estariam discutindo agora uma proposta que, de forma geral, troca território ucraniano por garantias de segurança de que o país não precisará ceder mais à Rússia.
Mas ainda há muitas dúvidas.
A Ucrânia poderia aceitar um acordo que encerra a guerra, mas lhe custa território — especialmente quando tantos milhares de ucranianos morreram tentando protegê-las?
Se lhe for pedido que ceda os 30% restantes da região de Donetsk que a Rússia ainda não ocupou, isso deixaria o flanco oeste, em direção a Kiev, perigosamente exposto?
E quanto à tão alardeada “Coalizão dos Dispostos” de Starmer — o que eles fariam pela Ucrânia?
As conversas anteriores sobre o envio de dezenas de milhares de soldados para lutar na Ucrânia se dissiparam.
Agora, fala-se mais em “proteger os céus e os mares”, ajudando a Ucrânia a reconstruir seu exército.
Mas mesmo que a paz se estabeleça no campo de batalha, ainda estamos em território perigoso.
Todos os especialistas militares com quem conversei acreditam que, no momento em que os combates cessarem, Putin reconstituirá seu exército e fabricará mais armas para estar em condições de, talvez em apenas três ou quatro anos, conquistar mais território.
Crédito,Getty Images
O que os EUA e a Europa querem das negociações de paz?
Donald Trump quer ver o fim da guerra na Ucrânia.
Ele já obteve alguns sucessos este ano ao encerrar — ou pelo menos interromper — guerras no Cáucaso, no Irã e, possivelmente, entre a Índia e o Paquistão. Mas, até agora, um acordo de paz com a Ucrânia não lhe foi alcançado e ele tem oscilado entre jogar a culpa em Moscou e Kiev.
Ele ouviu sua base de apoio do MAGA e sabe que há pouca disposição para o apoio contínuo dos EUA a uma guerra que a Ucrânia não pode vencer. Mas, em parte devido à sua clara amizade pessoal com Vladimir Putin, ele parece muito relutante em aplicar o tipo de pressão econômica sobre a Rússia que seus críticos dizem ser necessária para forçar Putin a parar de lutar.
Já os líderes europeus, principalmente os presentes em Washington nesta segunda, estão dolorosamente cientes de que a segurança da Ucrânia está inextricavelmente ligada à segurança mais ampla da Europa.
Os líderes europeus se opõem firmemente à ideia de uma fronteira internacional ser alterada à força, mas é exatamente isso que está sendo cogitado após a cúpula do Alasca e as visitas do enviado presidencial dos EUA, Steve Witkoff, à Rússia.
Por isso, os líderes reunidos na Casa Branca foram a Washington para demonstrar unidade com a Ucrânia e para convencer Trump de que não deveria haver acordo sem o envolvimento de Kiev. Além disso, esperam tentar proteger o presidente Zelensky de ser coagido a aceitar alguma proposta impossível que sua própria Constituição nacional não o permitirá aceitar.
Por outro lado, a Rússia quer toda a Donbass, enquanto a Ucrânia não quer abrir mão dela.
E qual será a forma dessa “garantia de segurança no estilo do Artigo 5” que está sendo potencialmente oferecida à Ucrânia? Terá o apoio incondicional dos EUA ou apenas uma promessa de intenção vagamente formulada?
No fim das contas, tudo se resume a isto: se for possível fechar um acordo que ponha fim a esta guerra aqui e agora, como o Ocidente coletivamente garante que ela não se repita no futuro?
*Com reportagem de Tom Bateman e Liza Fokht.
BBC








